20 de jan. de 2010

Saudades de Elis

(encontrei este texto perdido em minhas coisas - é velho...)

          Ouço Elis Regina no rádio, com Adoniran Barbosa, numa gravação antiga, com os dois conversando, rindo muito e, claro, cantando. Eu me emociono toda vez que ouço ou vejo qualquer coisa com Elis. Muitas vezes até às lágrimas. Ainda não consigo entender muito bem esta comoção que me aflige nesses momentos.
          Quando Elis morreu, em 1981, eu tinha 16 anos, estudava no SENAI durante o dia e começava o 2º grau à noite. Não fosse pelo fato de eu ser extremamente fechado, já àquela época, eu passaria facilmente como um adolescente comum. Mas me lembro bem daquele dia, quando soube da notícia pela televisão. Chorei muito, como nunca antes havia chorado pela morte de qualquer pessoa. Era quase desespero. Não me conformava e não podia aceitar que ela, justo ela, tivesse morrido. Nem quando meu padrinho morreu, quando eu tinha 14 anos, chorei e me desesperei tanto. Se me perguntarem o porquê eu sinceramente não saberei responder. Posso fazer muitas proposições, algumas só formadas hoje, adulto.
          Naquela época eu já ouvia muita música popular brasileira. Eu ouvia muito Bethânia, Caetano, Gal, Chico e Milton. Já não era comum gostar deles na minha idade. Era a década de 80, Abertura, e bandas de rock pipocavam no verão. Assim como meu gosto por livros e quadrinhos, que lia avidamente, meu gosto musical era realmente estranho. E tinha Elis nesse meio. Não sei porque, mas eu adorava quando exibiam na TV os especiais com ela. Eu acho que já sentia que o que ela emanava não era só a voz: era a alma, dela e da música que interpretava, que vinham junto com a voz, me invadindo todo, me emocionando inteiro, uma força arrebatadora e delicada ao mesmo tempo. Acho que é isso que as pessoas traduzem como "intérprete excepcional".
          Cada música com Elis era uma parte dela mesma, representando de forma intensa o que ela era. Samba, samba-canção, música de "fossa", bossa nova. Tudo era ela. Eu queria cantar como ela, fazer com a música o que ela fazia: extrair a emoção mais pura de dentro de seus vários sentidos.
          Levei anos para ter um disco de Elis. Tenho dois e algumas gravações esparsas. Tudo de Elis para mim é sempre muito novo, mesmo o que já é velho conhecido.
         Até hoje choro quando vejo Elis. Brigo com ela, xingo, digo, de maneira irracional e infantil, que ela não tinha o direito de ter-nos deixado quando havia tanto que ela ainda poderia fazer. Ouço músicas, hoje, que são a cara dela, e penso: isso ia ficar lindo na voz dela. Aí vem essa raiva e eu digo "não! niguém deveria ter o direito de partir com tanto talento e emoção para mostrar, tão cedo!". É injusto para conosco, que aprendemos a amar o amor que ela tinha, essa capacidade de entrega, em tudo. Não a conhecia pessoalmente, não assisti nenhum de seus shows, não tiva a possibilidade de vê-la senão na TV. Mas que saudade!
          Aos religiosos, aos espiritualistas, aos amigos e parentes dela: não se preocupem. Não quero atrapalhar o descanso de ninguém. Sou egoísta, sim, mas com ela. Porque me lembro de Ella Fitzgerald, velhinha, cantando no aniversário de 70 anos de Frank Sinatra e superando-o em talento, limpeza de voz e swing, e penso no que Elis estaria fazendo hoje e no que ela faria aos 70!
          Muitas coisas maravilhosas, com certeza. Tão boas quanto este momento com o reverenciável Adoniran, que comento depois. Hoje é para Elis, que mais uma vez me emociona às lágrimas, alegre por saber que ela existiu e permanece. "Como um estrela".
27/02/1995
12h12
Em tempo: hoje tenho quase todos os discos da Elis que foram lançados em CD e também os DVDs; e ela ainda me emociona. Demais.

2 comentários:

  1. Flavio:

    tinha oito anos quando a Elis se foi. Lembro-me muito bem de quando recebi a notícia e da dor que me causou. Acho que já nasci gostando dela! E acho também que poderia ter escrito o teu texto, por tanta identificação com os sentimentos relatados. Parabéns pela bela homenagem. Nossa estrela é ETERNA. Abraço. Janaina

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  2. Janaina, obrigado pela visita. Elis era de fato especial. Volte sempre.
    Abraços e um ótimo dia!

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